Dissertação - Marcelo Mascarenhas Wiegand

Relações tróficas entre mamíferos marinhos simpátricos do estuário da Lagoa dos Patos e área costeira adjacente, Rio Grande do Sul, Brasil

Autor: Marcelo Mascarenhas Wiegand (Currículo Lattes)

Resumo

O estuário da Lagoa dos Patos (PLE) (32º S), e sua área costeira adjacente, são usados principalmente por três espécies de mamíferos marinhos. A toninha (Pontoporia blainvillei) habita águas marinhas rasas e se alimenta de teleósteos e cefalópodes de pequeno porte. O boto (Tursiops truncatus) e o leão-marinho Sul-Americano (Otaria flavescens) habitam a região costeira principalmente, ocupando tanto a área estuarina como a região costeira adjacente, consumindo peixes teleósteos. A análise de isótopos estáveis de carbono e nitrogênio tem sido amplamente aplicada em estudos de ecologia trófica de mamíferos marinhos. Normalmente os tecidos dos predadores são mais enriquecidos nos isótopos mais pesados do que as presas e essa diferença é geralmente chamada de fator de discriminação trófica (Trophic Discrimination Factor - TDF). Os valores 13C e 15N dos predadores, juntamente com as de suas presas potenciais, podem ser usados para estimar a contribuição relativa de cada presa à dieta do predador através da aplicação de modelos de mistura isotópica. Estes modelos, no entanto, são altamente sensíveis aos valores do TDF. Assim, a escolha correta desses valores é um requisito básico nestes modelos de mistura para estimar as proporções de presas na dieta do consumidor. Neste trabalho, foi utilizada a análise de isótopos estáveis de carbono e nitrogênio na pele de toninhas, botos e leões-marinhos para avaliar a composição das suas dietas, o compartilhamento de recursos e a sobreposição de nicho isotópico. A fim de aplicar corretamente os modelos de mistura isotópica, diferentes métodos não-experimentais para estimar valores de TDF adequados foram testados. A área de sobreposição entre as elipses TDF-corrigidas e aquelas das presas foram usadas para testar TDFs obtidos da literatura e métodos matemáticos alternativos, a fim de avaliar quais os valores mais adequados para a pele e músculo de toninhas e leões-marinhos. A utilização de valores de TDF reportados a partir de experimentos de alimentação controlada em focideos de cativeiro resultou em nenhuma sobreposição entre as elipses leão-marinho TDF-corrigidas e as de suas presas para ambos os tecidos. Alguma sobreposição foi observada no caso da toninha usando TDFs publicados derivados de experimentos de alimentação controlada em cativeiro do boto. Os TDFs mais adequados foram aqueles calculados a partir da diferença entre a média ponderada dos valores isotópicos das presas e os valores isotópicos dos predadores: 13Cpele = 1,3 e 15Npele = 4,5 e 13Cmúsculo = 2,5 e 15Nmúsculo = 4,6 de leões-marinhos; . e 13Cpele = 2,2 e 15Npele = 2,9 e 13Cmúsculo = 1,6 e 15Nmúsculo = 2,2 em toninhas. Em seguida, aplicaram-se estes valores de TDF para descrever a dieta de toninhas e botos e leões-marinhos, respectivamente, por meio da aplicação de modelos de mistura isotópica aos valores isotópicos em pele destes predadores. Estes mostraram uma composição de dieta diversificada para o leão-marinho e a toninha com poucas presas principais. Por outro lado, a dieta do boto revelada pelo modelo de mistura demonstrou uma dominância de Trichiurus lepturus, com pouca contribuição de outras espécies de peixes. Também foi calculada a área de nicho isotópico como um proxy para o nicho ecológico das espécies, a fim de avaliar a sua sobreposição ou segregação e compartilhamento de recursos. Os leões-marinhos apresentaram os maiores valores isotópicos de nitrogênio e o maior nicho isotópico. Por outro lado, os botos apresentaram os menores valores isotópicos de nitrogênio, o menor nicho isotópico, não tendo nenhuma sobreposição com o leão-marinho. A toninha ocupou uma posição intermediária, com sobreposição parcial de nicho com o boto. Essa segregação de nicho e compartilhamento de recursos parece permitir a coexistência dessas espécies-chave de mamíferos marinhos no PLE e zonas costeiras adjacentes. A investigação dos hábitos alimentares e as relações tróficas destes componentes importantes desta rede trófica costeira devem auxiliar ações de manejo e conservação dirigidas à proteção deste rico ecossistema estuarino.

TEXTO COMPLETO

Palavras-chave: Mamíferos marinhosOtaria flavescensPontoporia blainvilleiTursiops truncatusEcologia tróficaDietaNicho isotópicoLagoa dos PatosRio Grande do SulBrasil